om a chegada da pandemia no Brasil, acendeu-se uma luz vermelha para a chamada internação longa. O termo abrange aqueles pacientes que, por causa do problema que os levou ao hospital, como a Covid-19, por exemplo, necessitaram ficar muito tempo em observação médica – ou, mesmo com a alta, ainda precisam de uma reabilitação.
Segundo dados da Associação Nacional dos Hospitais Privados (ANAHP), 25% dos leitos brasileiros são ocupados por este perfil de pacientes, que acabam por passar pelo processo de recuperação em suas próprias casas.
O problema é que 50% dos pedidos de home care são recusados pelas operadoras de saúde.
Para tentar solucionar essa questão, outro termo entrou em nosso vocabulário: a desospitalização. Ela começou a ganhar força por aqui com a ajuda dos hospitais de transição.
Como uma espécie de ponte para o domicílio do paciente, esses locais vêm para beneficiar o processo de reabilitação intensiva, ou a redução da complexidade do cuidado, além de capacitar cuidadores e familiares antes do retorno ao lar.
Um segundo perfil de atendimento é o de pacientes em cuidados paliativos de fim de vida, com sintomas de difícil controle e perda importante de independência para atividades rotineiras.
Para essas pessoas, o objetivo é um controle eficaz dos sintomas e acolhimento a pacientes e familiares, garantindo mais qualidade de vida no dia a dia delas.
“A adoção desse modelo propicia a programação da terapêutica, desde a fase aguda até a reabilitação, cumprindo seu papel na redução do custo de serviços de saúde e do número de consequentes reinternações”, explica Lucas Andrade, médico, sócio e idealizador da Clínica Florence, primeiro hospital de transição do Norte/Nordeste do Brasil, que hoje tem unidades em Recife e Salvador.
UM EXEMPLO A SER SEGUIDO
Os hospitais de transição já são bastante conhecidos nos países do hemisfério Norte. Por lá, o modelo é direcionado não apenas aos pacientes idosos, mas também para a população em geral, como meta de redução de custo e planejamento assistencial.
Para se ter uma ideia da dimensão da importância desse processo de desospitalização, o modelo de transição de cuidados traz produtividade a um setor marcado por intenso desperdício e que carece de soluções diversas além do hospital e atenção domiciliar.
“É possível, através do paciente certo, no lugar certo, na hora certa, entregar um plano de cuidados mais adequado por um custo significativamente menor”, comemora Lucas.
Muitas vezes, os pacientes podem ser transferidos diretamente de unidades fechadas (UTIs e semi-UTIs) – caso, por exemplo, de pessoas que tiveram a funcionalidade e autonomia comprometidas após um AVC grave, infarto, quadro de sepse, fratura de fêmur, Covid e outras doenças agudas.
UM HOSPITAL PET FRIENDLY
Para Lucas Andrade, os hospitais de transição representam um marco no cuidado humanizado, intensivo em reabilitação, e que olha o indivíduo em todas suas dimensões de sofrimento.
“Na Florence, por exemplo, temos instalações projetadas para criar uma atmosfera mais pessoal e acolhedora e um serviço que possibilita maior interação entre o paciente e seus familiares”, conta.
“As visitas são permitidas 24 horas por dia e é possível programar visitas de crianças e até de animais de estimação.”
Trata-se de uma proposta de cuidado integral das necessidades de pacientes e seus familiares, em todas as áreas – ou seja, física, psicológica, espiritual e social – realizada por uma equipe interdisciplinar altamente qualificada.
São médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, psicólogos, assistentes sociais, farmacêuticos e nutricionistas 24 horas por dia, 7 dias por semana.
O tempo de permanência do paciente no hospital de transição vai depender, claro, da complexidade do problema. “Em média, pacientes em cuidados paliativos costumam ficar um período menor (em particular os oncológicos), em torno de 28 dias”, afirma Lucas.
“Pacientes em reabilitação, em especial os neurológicos graves, podem necessitar de até 12 semanas de reabilitação intensiva.”
TIME MERGULHA NA HISTÓRIA DO PACIENTE
Médicos de diversas especialidades podem encaminhar seus pacientes desde que tenham indicação para uma das linhas de cuidado oferecidas: reabilitação funcional, adequação de cuidados ou cuidados paliativos de fim de vida.
As unidades de transição podem contribuir, e muito, com a recuperação das pessoas. Isso porque, antes mesmo da admissão do paciente, o time multidisciplinar busca conhecer a história do paciente, suas crenças e preferências.
Só então, junto com a família, são definidas e mapeadas as melhores formas de tratamento, assim como os cenários de evolução possíveis e adaptações necessárias quando do retorno do paciente ao domicílio.
“O plano de cuidados prioriza a retomada da autonomia, a prevenção de complicações e a melhoria da qualidade de vida”, esclarece o médico.
Para os pacientes, a desospitalização significa home care; para seus familiares, representa 50% das negativas das operadoras de saúde.
Em hospitais de transição, a alta é programada de forma multidisciplinar desde o momento da internação, aproveitando o aparato técnico-diagnóstico como estrutura para montar linhas de cuidados aos pacientes.
IMPACTO DO TRABALHO: UMA UTI DE 13 LEITOS POR 3 MESES
A importância de modelos de hospitais de transição como o da Florence para todo o Brasil é apresentada em números: ao longo dos quase cinco anos de existência da clínica, mais de 1.300 pacientes e seus familiares foram impactados.
“Endereçamos produtividade no setor de saúde e temos sido motivo de orgulho para este segmento”, afirma Lucas Andrade.
“Temos um Net Promoter Score [NPS] de 90%, com menos de 7% de perdas; 88% de nossas altas de pacientes em reabilitação são dentro do prazo planejado no momento da admissão; nosso seguimento de alta após 90 dias apresenta uma qualidade de vida percebida de 8 em 10.”
Além disso, mais de 180 pacientes que tiveram a forma grave da Covid-19 foram reabilitados.
“O impacto de nosso trabalho, no que diz respeito a liberação de leitos pelos pacientes que vieram direto da UTI, equivale à criação de uma Unidade de Terapia Intensiva de 13 leitos por 3 meses, durante o período mais crítico da pandemia”, compara o médico.
“Publicamos nossa experiência de reabilitação pós-Covid em uma revista científica internacional de referência em cuidados pós agudos, a AMDA [The Society for Post-Acute and Long-Term Care Medicine]”, orgulha-se ele – com razão.