O setor de transição tem se consolidado como um elo fundamental na cadeia de assistência à saúde no Brasil. Com cerca de 20 anos de existência e uma atuação mais intensa na última década, além de preencherem a lacuna da escassez de leitos, cumprem com o propósito de trazer mais eficiência ao processo de saúde, reduzindo os custos da internação prolongada entre 30% a 75%.
Isso se deve ao fato de que o custo de um paciente no hospital de transição é cerca de 55% a 60% de um hospital geral, por demandarem uma estrutura menos complexa e com menos investimentos em tecnologias de equipamentos. O que é fundamental em um cenário em que se estima um aumento de R$ 67 bilhões, nos próximos dez anos, nos gastos em saúde no país. Não é em vão que existe a perspectiva de que esse número siga em ascensão, chegando a quase quatro mil leitos até 2026.
Mas, em que ponto estamos atualmente? Embora já tenha existido um notório crescimento no número de leitos entre 2018 e 2023, de mais de 100%, quando nos comparamos com países da Europa ou com Estados Unidos e Austrália, por exemplo, ou observamos a proporção de renda no Brasil, percebemos o quanto ainda podemos avançar. Além disso, se pensarmos em saúde globalmente, aproximadamente 50% das pessoas necessitarão desse tipo de cuidado em algum momento, o que aumenta ainda mais as oportunidades.
A despeito dessa evolução para nos estabelecermos e mostrarmos cada vez mais nossa relevância, ainda estamos no início dessa curva, com muito a ser feito e com novos desafios a serem superados. Inclusive, diferentes daqueles que enfrentávamos inicialmente, quando tínhamos como necessidade definir e comunicar claramente os nossos diferenciais com relação aos outros tipos de unidades de saúde.
Havia uma dificuldade significativa em demonstrar ao setor, principalmente privado, a importância e a especificidade dos serviços oferecidos. Com o tempo, no entanto, está ficando claro que os hospitais de transição têm um papel bem definido na jornada de cuidados do paciente e ocupam, de forma coerente e lógica, espaços nos grandes centros urbanos.
Hoje nossas barreiras já são outras. Precisamos atuar no sentido de aumentar nossa capilaridade e chegarmos em mais “praças”. Nossa presença é forte em algumas capitais e também em cidades maiores. No entanto, não podemos esquecer que nossa utilidade e capacidade de melhorar a sustentabilidade do sistema vai muito além.
Tenho refletido muito sobre isso e acredito que um dos gargalos para nossa expansão está em construímos um modelo mais bem-planejado.
Para chegarmos a mais lugares e a mais pacientes, sem que eles tenham que vir para os grandes centros, uma alternativa viável seria a regionalização. Por que não criar unidades de transição regionais, atendendo várias cidades menores em torno de um centro?
Uma estrutura similar ao que já acontece com os hospitais gerais e que ajudaria a manter o paciente próximo ao seu ambiente natural e de sua família, com internações breves e fora de sua cidade, facilitando um retorno rápido à plenitude do convívio social.
Para que isso aconteça e possamos mais rapidamente nos integrarmos na cadeia de serviços, é essencial nos adaptarmos às necessidades desses locais.
Além disso, será inevitável também um passo atrás. O da educação não só para conscientizar a população dessas regiões de que viemos para somar, como para mostrar para os profissionais de saúde todos os benefícios que podemos agregar a todos os players da cadeia assistencial
Isso passa também pela capacitação dos recursos humanos – o que inclusive extrapola o âmbito regional, diga-se de passagem. Ao mesmo tempo, em que o principal diferencial de um profissional em uma unidade de transição é sua habilidade de coordenar eficazmente a passagem dos pacientes entre diferentes estágios de cuidados de saúde e a humanização, esse papel exige conhecimento especializado.
E é nisso que precisamos trabalhar, incentivando formações específicas, disseminação de conhecimento e incentivo, ainda nas universidades. Essa é uma parte importante desse processo e o que permitirá que os hospitais e clínicas de transição assumam de vez o seu papel de protagonismo, entregando valor real não só aos pacientes como para outros elos, incluindo operadoras de saúde.
*Frederico Berardo é médico, presidente da Associação Brasileira de Hospitais e Clínicas de Transição (Abrahct)
Artigo exclusivo para o portal Futuro da Saúde: https://futurodasaude.com.br/setor-de-transicao-frederico-berardo/